Como ler livros, de Mortimer Adler & Charles Doren

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Publicado pela primeira vez em 1940, o livro “Como ler livros” do filósofo aristotélico e escritor estadunidense, Mortimer Adler, e do também norte-americano, Charles Van Doren, tem auxiliado muitos iniciantes, e até mesmo leitores avançados, no consumo de obras literárias. O livro já se tornou um clássico no meio acadêmico, sendo reconhecido como o mais bem-sucedido guia de compreensão de leitura. E publicado no Brasil em 2010 pela editora É Realizações, a obra vem ganhando adeptos de todas as áreas de estudo e a recomendação de grandes nomes da intelectualidade.

O livro começa com uma rica introdução sobre diversos estilos literários, expondo as peculiaridades que cada um destes possui. Por exemplo, Adler, como um bom filósofo aristotélico, faz uma breve análise sobre A Poética e suas observações sobre os “meios pelo qual o discurso poético apresenta à imaginação humana o universo do possível: 1- Retórica, o meio pelo qual se leva alguém a adotar uma crença, a arte de convencer; 2- Dialética, o meio por qual se averigua um discurso e a razoabilidade de uma crença; e a Lógica Analítica, os meios da demonstração apodítica, ou certeza científica”. Usando este exemplo, o escritor nos mostra a influência que uma obra tem sobre o leitor, dialogando e convencendo-o de suas ideias.

O livro nos ensina sobre a importância da busca pela verdade como fim último em nosso papel como investigadores de uma obra. E sobre alcançar essa verdade, é-nos ensinado um certo tipo de hierarquia entre os estilos literários, dada na seguinte ordem: 1- Poesia; 2- Teatro; 3- Prosa; 4- História; 5- Ciência; e finalmente, 6- Filosofia. Sendo esta última a autoridade máxima na reflexão das ideias e ideais, afinal, a história relata, a Filosofia debate-a; a ciência descobre, mas a Filosofia é incumbida de refletir, dar significado e importância, validar ou reprovar o uso de tal descoberta, julgar.

A velha discussão sobre o papel do aluno e do professor também é posta na mesa. O leitor deve fazer uma leitura passiva ou ativa do texto? Ele deve analisar com senso crítico ou deve acreditar em tudo que lhe for exposto? Respondendo a essas questões, Adler defende uma leitura ativa, principalmente nas obras expositivas. Quanto à leitura das obras de ficção, ele nos diz que “o leitor deve adotar uma postura passiva, mas de coração ativo”, permitindo que nos encontremos imersos no universo criado pelo autor.

Já as leituras que exigem maior grau de senso crítico, o filósofo defende uma postura ativa mais cautelosa e minuciosa dos textos. O leitor deve “aceitar” as ideias do autor, sem exceção, de forma que possamos mergulhar na mente do escritor, e somente nadando nas mesmas águas de onde todo o raciocínio sobre o objeto de estudo foi construído é que podemos, no fim, após de fato ter compreendido o texto, concordar ou discordar.

“O autor deve ser superior ao leitor, e o leitor deve tentar ao máximo se igualar ao autor”, diz Adler. Não como uma mera disputa de egos, mas como uma ferramenta para a absorção de todo conteúdo debatido pelo autor. E partindo dessa primícia, nos é revelado um dos mais importantes tópicos do livro, o critério rígido que deve ser adotado na escolha dos materiais que pretendemos ler em nossa curta caminhada literária, pois, como dizia Francis Bacon, “alguns livros devem ser degustados, outros devem ser engolidos, enquanto alguns poucos devem ser mastigados e digeridos”. Degustar pode ser interessante num churrasco com a família e amigos, mas certamente não é capaz de nos alimentar satisfatoriamente por todos os dias, e no final da vida podemos nos arrepender de não ter experimentado dos melhores frutos que o mar e o campo nos oferecem.

O leitor só pode ser considerado um leitor completamente maduro após praticar a “descoberta sem auxílio(do professor)”. O leitor somente é coroado com o amadurecimento após conseguir compreender e dialogar com o autor de um texto sem a orientação de um tutor. Para isso – e aqui chegamos ao coração da obra de Adler e Doren – é preciso dominar todos os quatro graus de leitura.

O primeiro grau é o da Leitura Elementar. Esta categoria engloba algumas etapas, como a da alfabetização inicial, alcançada por uma criança média; o desenvolvimento vocabular e o uso de contextos; a alfabetização funcional, que nos capacita a ler placas de trânsito ou legendas com certa facilidade, por exemplo; e finalmente, a última etapa, a alfabetização do 9º ano, que forma o leitor maduro.

O segundo grau de leitura é chamado por Adler de Leitura Inspecional. Este tipo de leitura nos força a fazer perguntas cruciais sobre o material investigado ao folheá-lo, como por exemplo, “que tipo de livro é este?”, “o que ele diz, de modo geral?”, “qual a ordem estrutural pela qual o autor desenvolve seus conceitos e entendimentos do assunto?”. Requer uma atenção razoavelmente minuciosa em busca de entender a intenção do autor e a estrutura do raciocínio adotado.

O terceiro grau alcançado por um leitor é chamado por Adler de Leitura Analítica. Como o nome sugere, esta requer uma análise muito mais exigente do material consumido. Neste estágio, o título e assunto do livro devem ser categorizados; a unidade do livro deve ser resumida em uma única frase, no máximo em um parágrafo; o problema que o autor tenta solucionar deve ser claramente identificado; as palavras-chave do livro devem ser detectadas; as principais frases, marcadas; é preciso dizer com razoável grau de certeza “eu entendo” antes que possamos dizer “concordo” ou “suspendo o julgamento”; quando discordarmos, sejamos sensatos, de maneira que não gere disputas desrespeitosas; é necessário reconhecer a diferença entre conhecimento e opinião, fornecendo razões para quaisquer julgamentos críticos a serem feitos; é importante mostrar onde o autor está desinformado ou mal informado. Somente será possível dialogar e julgar quais problemas o autor conseguiu solucionar e quais ele ficou devendo, quando todas essas etapas forem concluídas.

Por fim, o quarto e último grau, e que somente um leitor completamente maduro pode e deve alcançar, é a Leitura Sintópica(syn + topikós). De forma bem simplificada, a Leitura Sintópica significa ler sobre um determinado tópico de forma conjunta. Explico: se o objeto de estudo do leitor é o estudo do Cânon Bíblico, é necessário selecionar, muito criteriosamente, uma bibliografia com as principais obras que tratam da crítica textual específica. Este tipo de leitura possibilita que você tenha contato com o que de melhor foi escrito sobre um tópico e possa exercer um olhar crítico sobre as discordâncias que podem vir a existir entre os autores. Adler destaca este como o nível mais avançado que um leitor pode alcançar.

Desta forma, “Como ler livros” nos mostra que “o ato de comprar é apenas o prelúdio da posse total do livro. A propriedade completa sobre o livro só é estabelecida quando ele passa a fazer parte de você”, e Adler, juntamente com Doren, nos ensina de forma magistral como isso é possível.

Referência:
ADLER, Mortimer; DOREN, Charles. Como ler livros: O Guia Clássico para a Leitura Inteligente. São Paulo: É Realizações, 2010. 432 páginas.

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